Um dos maiores homens da América Latina

Um dos maiores homens da América Latina
Salvador

domingo, 31 de julho de 2011

Mais uma pérola do nosso frei Beto



Agora a voracidade consumista proclama a fé que identifica o infinito nos bens finitos

Frei Betto
Para o filósofo Edgar Morin, a ciência, ao buscar autonomia fora da tutela da religião e da filosofia, extrapolou os próprios limites éticos, como a produção de armas de destruição em massa. Os cientistas não dispõem de recursos para controlar a própria obra. Há um divórcio entre a cultura científica e a humanista.
Exemplo paradigmático desse divórcio é a atual crise econômica. Quem é o culpado? O mercado? Concordar que sim é o mesmo que atribuir ao computador a responsabilidade por um romance de péssima qualidade literária.
Um dos sintomas nefastos dos tempos em que vivemos é a tentativa de reduzir a ética à esfera privada. Fora dela, tudo é permitido, em especial quando se trata de reforçar o poder e aumentar a riqueza. Obama admitiu torturar os prisioneiros que deram a pista de Bin Laden, e não houve protestos com sufi ciente veemência para fazê-lo corar de vergonha.
A globocolonização, inaugurada com a queda do Muro de Berlim, conhece agora sua primeira crise econômica. E ela explode no bojo da fragmentação da modernidade. “Tudo que é sólido se dissolve no ar...” Vale acrescentar: “... e o insólito, no bar”.
Esfareladas as grandes narrativas que norteavam a modernidade, abre-se amplo espaço ao relativismo. O projeto emancipatório se dilui no terrorismo e no assistencialismo compensatório guloso de votos. O futuro se desvanece.
Para os arautos do neoliberalismo, “a história terminou”. O presente é, hoje, o moto perpétuo. O passado, mera evocação, como a pintura que se contempla na parede de um museu. Nada de querer acertar contas com ele.
Graças às novas tecnologias, o espaço se contraiu e o tempo se acelerou. O outro lado do mundo está logo ali, e o que lá ocorre é visto aqui em tempo real. Tudo isso impacta nossos paradigmas e nossa escala de valores. Paradigmas e valores soam como contos da carochinha comparados a ensaios de bionanotecnologia.
O mundo real se cindiu e não condiz com o seu duplo virtual. Via internet, qualquer um pode assumir múltiplas identidades e os mais contraditórios discursos. Agora, todos podem ser simulacros de si mesmos.
Não há mais propostas libertárias que fomentem utopias, nutram esperanças e semeiem otimismo. Ao olhar pela janela, não há horizonte. O que se vê reforça o pessimismo: o aquecimento global, a ciranda especulativa, a ausência de ética no jogo político, a lei do mais forte nas relações internacionais, a insustentabilidade do planeta.
Se não há futuro a se construir, vale a regra do prisioneiro confinado à sua cela: aproveitar ao máximo o aqui e agora. Já não interessam os princípios, importam os resultados. O sexo se dissocia do amor como os negócios da atividade produtiva.
A cultura do consumismo desencadeia duas reações contraditórias: a pulsão pela aquisição do novo e a frustração de não ter tido tempo sufi ciente para usufruir do “velho” adquirido ontem... A competitividade rege as relações entre pessoas e instituições. Somos todos acometidos de permanente sensação de insaciabilidade. Nada preenche o coração humano. E o que poderia fazê- lo já não faz parte de nosso universo teleológico: o sentido da vida como fenômeno, não apenas biológico, mas sobretudo biográfico, histórico.
Agora a voracidade consumista proclama a fé que identifica o infinito nos bens finitos. O princípio do limite é encarado como anacrônico. Azar nosso, porque todo sistema tem seu limite, da vida humana ao mercado. Sabemos por experiência própria o que acontece quando se tenta ignorar os limites: o sistema entra em pane. Mas, em se tratando de finanças, não se acreditava nisso. A riqueza dos donos do mundo parecia brotar de um poço sem fundo.
Duas dimensões da modernidade foram perdidas nesse processo: a dignidade do cidadão e o contrato social. Marx sabia que a burguesia, nos seus primórdios, era uma classe revolucionária. O que ignorava é que ela de tal modo revolucionaria o mundo, a ponto de exterminar a própria cultura burguesa. Os valores da modernidade evaporam por força da mercantilização de tudo: sentimentos, ideias, produtos e sonhos.
Para o neoliberalismo, a sociedade não existe, existem os indivíduos. E eles, cada vez mais, trocam a liberdade pela segurança. O que abastece este exemplo singular de mercantilização pós-moderna: a acirrada disputa pelo controle do mercado das almas. As religiões tradicionais perdem seus espaços territoriais e o número de fiéis. Agora, no bazar das crendices, a religião não promete o céu, e sim a prosperidade; não promete salvação, e sim segurança; não promete o amor de Deus, e sim o fi m da dor; não suscita compromisso, e sim consolo.
Assim, o amor e o idealismo ficam relegados ao reino das palavras inócuas. Lucro e proveito pessoal são o que importam.

domingo, 26 de junho de 2011

Trabalho e vampiros

Desde a antiguidade o mito do vampiro permeia o imaginário das mais diversas culturas da humanidade: entre os mongóis o Demônio Tibetano, para os gregos, Lamia uma espécie de sereia, Lillith uma fábula judia. Mas o estereótipo do imaginário ocidental é a oriunda do mito eslavo do príncipe Vlad Drácula, imagem fixada pelo cinema em diversos filmes americanos. Retratado de forma banal e superficial, não aborda a verdadeira metáfora que permeia o tema.

Até mesmo para os mais incrédulos a alma parece uma entidade marginal ao que realmente somos. Ela se configura como um resguardo livre dos pecados da nossa personalidade, caráter e virtudes. Em hebraico o termo alma está associada ao sangue – nefesh- assim como às necessidades vitais cujo termo alcança maior extensão: desejo, respirar e vida. Alma para os gregos significa psique, italiano anima. Acreditava-se que era no sangue um dos muitos lugares do corpo onde a alma se localizava. Partindo-se dessas premissas podemos começar a entender como os povos, nos mais diferentes lugares, criaram o mito do vampiro. Entidades que se alimentam daquilo que é vital para o sujeito: seu anǐma, o que nos faz viver.

Para se fazer uma analogia com o que é mostrado nas telas, vamos equiparar sob a ótica mais elaborada da análise psico-social do significado de vampirismo. As cenas mais comuns são:

Cena 1: uma criatura sedutora olha nos olhos da vítima e hipnotiza-a. No mesmo instante sua jugular é oferecida.

Cena 2 : a pessoa está dormindo e o vampiro aparece no meio da noite para se alimentar do seu sangue.

Cena 3 : uma pessoa que foi vítima do vampiro, vampiriza uma ou mais pessoas sendo estas um ou mais de seus pares (filho, pais, esposos, amigos).

Cena 4 : a pessoa passa a se comportar como um zumbi.

Cena 5 : o vampiro se desmaterializa com a luz do sol.

Vamos dar o devido enfoque para essas cenas aparentemente banais. Antes gostaria de fazer uma breve digressão sobre a subjetividade na sociedade do espetáculo.

Ela não está aí para nos fazer pensar e sim para amortecer, anestesiar nossos sentidos. Essa digressão tem a ver com o conjunto de idéias postas para que nós nos entreguemos com mais facilidade ao mundo pseudofactual que querem nos fazer crer a todo custo. A dominação se dá com uma capilaridade tecida em todas as esferas sociais que freqüentamos: baladas, reunião social, ambiente de trabalho, etc, ou assistimos seja em noticiários, Internet, cinema, novelas, música, etc. Tudo isso articulado nos embaça a visão daquilo que chamo de “saber ler o mundo”.

Feita essa digressão, faz-se necessário a análise. É importante deixar aqui claro que são vários vampiros que atuam na nossa sociedade,: O Estado, a sociedade, a religião com seus dogmas e preceitos morais, são os mais claros. Aqui o foco será o mundo do trabalho. Vamos a cena 1:

As seduções a que estamos submetidos pelas mais diversas razões apresentam-se primeiramente como uma oferta de possibilidade de um bem estar melhor. Abrimos mão de um tempinho a menos conosco e para com nossa família, uma responsabilidade maior no trabalho, um almoço comido mais rápido (que logo se torna rotina), e por aí vai. Aos poucos vamos nos esquecendo de nós mesmos e por conseqüência vamos nos esquecendo dos nossos entes. Oferecemos nossa jugular ao vampiro. O que nos leva a cena 2.

A noite representa na alegoria o nosso estado inconsciente. Vamos sendo absorvidos pelas seduções sem nos darmos conta. O mundo das maravilhas se descortina: podemos comprar a beleza, ser realizado sexualmente, morar melhor, ter um carro novo, ser realizado profissionalmente, ser reconhecido pelos próximos, etc, etc. Somos diuturnamente bombardeados com esses valores e quando não os temos, há uma sensação de fracasso. Mesmo que não possamos usufruir de todas essas benesses elas ao menos se afiguram como algo próximo, ficamos traiçoeiramente felizes. E nelas podemos ainda incorrer no erro do exagero. A vaidade dessas conquistas pode nos tornar um zumbi. Podemos reconhecer pessoas vampiras pelos seus modos e comportamentos, mas alguns pontos todos eles tem em comum: desequilíbrio interno, frustração, baixa auto-estima, ressentimento, complexo de perseguição, insegurança e, acima de tudo, o egoísmo. Acredita que seus esforços para obter os benefícios adquiridos são conquistas somente suas, tem dificuldade de compartilhar “suas conquistas”. O processo de mutação do indivíduo começa neste estado inconsciente.

Na cena 3 A vítima do vampiro, necessitando de energia vital, parte para a busca de energia para sua satisfação física e psíquica. São as pessoas que estão a sua volta as próximas vítimas. O vampirismo começa a agradar àqueles que se vêem tanto no lugar do predador quanto no da presa, portanto, cuidado! O prazer de tirar do outro se conecta ao prazer de ser aliviado do que lhe é básico. Acha que é a pessoa mais inteligente e talentosa da face da Terra. Persegue com afinco os símbolos do status e do poder sobre seus pares. É ríspido e esbanja auto-suficiência. Quando está por cima, pisa nos de baixo, seja emocional ou financeiramente. Nutre-se da destruição da auto-estima alheia, o que o ajuda a projetar-se para o alto, não se importando com a queda, não crê jamais que cairá, torna-se onipotente. Tem dificuldade para assumir qualquer tipo de compromisso. Está sempre à procura de novos parceiros amorosos (a maior fonte de energia roubável) e é instável com os antigos amigos. Alimenta-se da dedicação das pessoas, mas costuma abandoná-las ao considerar que se tornaram monótonas ou que já deram o que tinham para dar, uma vez esgotada a energia vital da outra, por isso a instabilidade para com as pessoas. Este tipo de pessoa contraiu uma anemia moral e emocional grave. Por enquanto ainda é um zumbi, está apática o que nos remete a cena 4.

Um zumbi não tem moral, não se preocupa com o outro nem consigo próprio. Os vícios tornam-se cada dia mais arraigados no seu dia-a-dia pois a realidade do cotidiano se torna banal. Suas emoções tem de estar sempre num crescente, desejável por todos, porém sem limites para parar. Não encontrando molda-se nas sombras da sociedade, obcecado por sangue (e outros fluidos corporais), incorpora o lado mais escuro, porém não menos real da existência humana. Se ainda não se tornou um vampiro, falta muito pouco. O processo de vampirização pode ser revertido com a metáfora da luz. Cena 5

Obviamente que aqui estamos falando do mundo do trabalho e, me desculpem os menos crédulos ideologicamente, do capitalismo. Demorou, mas chegamos lá. Karl Marx compara o capitalista com o vampiro: "o capital é trabalho morto que, como um vampiro, vive somente de sugar o trabalho vivo e, quanto mais vive, mais trabalho suga (…) o prolongamento do dia de trabalho além dos limites do dia natural, pela noite, serve apenas como paliativo. Mal sacia a sede do vampiro por trabalho vivo (…) o contrato pelo qual o trabalhador vendeu ao capitalista sua força de trabalho prova preto no branco, por assim dizer, de que dispôs livremente de si mesmo. Concluído o negócio, descobre-se que ele não era um 'agente livre', que o momento no qual vendeu sua força de trabalho foi o momento no qual foi forçado a vendê-la, que de fato o vampiro não largará a presa 'enquanto houver um músculo, um nervo, uma gota de sangue a ser explorada' (citação de um texto de 1845 de Friedrich Engels).

As tentações e fascínios que o sistema capitalista nos acena faz-nos vender a nossa alma, oferecer nosso sangue para uma entidade obscura, um grande devorador de anima. Deixamos de lado as coisas que deveriam ser as principais preocupações do ser humano. Um bem estar verdadeiro, calcado na satisfação de viver verdadeiramente a nossa essência. Não digo com isso que não devemos trabalhar, isso é primordial para movimentar o mundo e deveria estar voltado para a realização do homem em todas as esferas do conhecimento. Sem alma não cantamos, não lemos, não dançamos, não apreciamos as pessoas com aquilo que elas tem de belo para mostrar. O mundo do trabalho como está canonizado hoje afasta-nos dos reais prazeres e inculca-nos uma mentalidade que se auto-alimenta no consumo de bens materiais ou de valores que não correspondem à verdadeira aptidão do ser humano. sobre isso basta percebermos o quanto são desvalorizadas as pessoas que lidam com as artes, músicos e atores de teatro se não estiverem inseridos na indústria cultural capitalista, é quase um pária no mundo do trabalho.   O vampiro/capitalismo é, sob todos os aspectos, o objeto que leva à perversão, à transgressão da moral social. Sempre associado à beleza e à promessa de prazer, ele é a personificação de nossas possíveis sublimações da morte física, burlando a natureza mortal do ser humano. “viver é muito perigoso”, dizia Guimarães Rosa, estamos sujeitos às tentações e o melhor que podemos fazer é estarmos atentos, cuidar do seu amor, caminhar para as luzes. afaste-se da pessoa que se preocupa em demasia consigo mesmo. Esse é um vampiro em potencial. Não perca tempo tentando convencê-lo de que ele cometeu um erro, pois negará até a morte. Não dê crédito aos feitos grandiosos que relata. Não espere favores gratuitos, ele sempre vai querer algo em troca. Afaste-se!
Existem alguns antídotos para se prevenir dos vampiros: cultive sua alma, pratique uma dança, cante, toque um instrumento, faça teatro e mais do que tudo ame as pessoas que te amam. Mesmo que falem que esse remédio está fora de moda. Ainda dá tempo de reconquistar seus entes. Ame à moda antiga, é moderno, não alimente seu sofrimento com buscas banais.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

O mundo do trabalho.

Olá pessoal, amigos e visitantes!

Em breve iniciarei minhas postagens neste blog. Pensamentos dispersos e compartilhamento de idéias. Neste primeiro momento quero postar algumas observações sobre o mundo do trabalho. Trabalho no sindicato dos bancários de São Paulo e tenho percebido como as pessoas estão adoecendo física e mentalmente.
Quero falar do isolamento a que são submetidos os trabalhadores de todas as áreas laborativas, principalmente a bancária.
Vejo que meu trabalho como protagonista na organização por local de trabalho, OLT, depende da colaboração dos trabalhadores da área. O massacre a que são submetidos os bancários só vem se acumulando com o passar dos anos. Percebo que o isolamento acaba causando uma espécie de "aleijamento" das relações pessoais dos trabalhadores da categoria. O adoecimento aparece de maneira sutil e vai tomando conta da pessoa sem ela perceber. Uma dorzinha aqui, uma separação ali, pressão alta (do banco e do corpo) o consolo do álcool, prozacs e similares e muita análise. As pessoas sentem-se incompreendidas dentro do banco e quando têm uma postura diferente, são isoladas pelos gestores.
E para quem pensa que essa situação ocorre somente nos bancos privados, engana-se. No Banco do Brasil e na CEF a situação é igual ou muitas vezes pior.
Brevemente escreverei sobre a metáfora dos vampiros, que nos assola. Pretendo tambem postar materiais e depoimentos que chegarem, prometo ler todos e publicar aqueles que não infrinjam a proposta aqui apresentada.
Conto com um "oi" neste primeiro momento.
Um Abraço a tod@s,
Jurandir Chamusca